Hilda Hilst, Irvin D Yalom
e eu
Cida Sepulveda
Escrever é representar-se, expor-se, quebrar a aparência e pescar um momento, uma vertente, um sonho, uma dor, enfim, retratar a vida em suas manifestações distintas, sutis, profundas, reais ou fantasiosas.
Acabo de ler no Correio Popular de Campinas que a casa de Hilda Hilst foi tombada. A escritora que se lançou à arte da escrita para garantir sua propagação.
Hilda brigou para ser reconhecida. As dificuldades pelas quais passou nada mais são do que o reflexo da falta de valorização do artista, neste país que finge desconhecer seus talentos.
Leio sobre a propagação da vida no livro de Irvin D Yalom, De frente para o sol, cujo tema é “como superar o terror da morte”. Uma das saídas para superarmos o terror da inexistência é nos propagarmos através dos nossos atos que marcarão pessoas, que transformarão histórias anônimas, muitas vezes, de gente que nem soube de nossa passagem por aqui.
A arte é um dos caminhos para essa propagação. A arte tem o privilégio da liberdade. O verdadeiro artista não é conveniente, não reproduz as estruturas arcaicas de poder e ódio. O verdadeiro artista delata a hipocrisia, desarruma o ambiente, destrói as aparências.
Hilda Hilst, em seu livro “Cascos e Carícias & Outras Crônicas” (crônicas publicadas no Correio Popular), criticava o nosso bom comportamento, a nossa felicidade frígida, e nos atingia cruel e amorosamente.
Hilda faz parte do meu imaginário poético como uma escritora rebelde, escancarada. Lamento o tempo que não a visitei, a timidez que me impediu de ir conhecer pessoalmente a fera. Mas, ela sabia que um dia eu escreveria sobre ela e, na minha pequenez, ousaria transcrevê-la:
“... Vocês me preferem terna, lúcida, sensível, austera, ou naquele desopilante escracho de antes, tornando alegre o teu às vezes desesperado café-da-manhã?”
Ler é ir ao encontro do outro, é desenraizar-se para crescer-se. Um processo tão inútil quanto vital. Desencontrar-se para redescobrir-se. Ou simplesmente para purgar a solidão dos tempos.
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Cida Sepulveda é
formada em Letras pela UNICAMP, escreve poemas e contos, publicou Sangue de Romã (2004) e foi finalista do 1o. Concurso Contos do Rio com "O Açougue", promovido pelo caderno "Prosa e Verso", d'O Globo. Publicou, em 2007, pela Bertrand Brasil, o livro de contos Coração Marginal, sobre o qual o poeta Manoel de Barros fez o seguinte comentário: "... Esse Boca Suja é duro cruel e seco, mas pela linguagem você o fez atraente e belo. Um estilo! Desesperador. Que zomba das tiranias semânticas. E renova o nosso idioma...".
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