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Contos

A ESPERA

Margarete Hülsendeger

"Corro perigo

Como toda pessoa que vive

E a única coisa que me espera

É exatamente o inesperado"

Clarice Lispector

 

- Quanto tempo mais teremos de esperar?

- Não sei, mas não adianta ficarmos nervosas. Quando chegar a nossa vez, eles virão nos avisar.

- Achas que estamos fazendo a coisa certa? Quem sabe pensamos melhor?

- Não! Eu não quero pensar mais. Cansei de pensar! De ficar pesando os prós e os contras. Se queres mudar de idéia, fica à vontade, eu já me decidi.

- Será que não há outra solução? Talvez devêssemos conversar com os nossos pais.

- Meus pais?! Está-se vendo que não nos encontramos há algum tempo. Não lembras mais de como eles são. Se ficarem sabendo, são capazes... Sei lá, não quero pensar nisto agora. Porém, se acreditas que os teus pais podem te ajudar, o melhor é que esqueças tudo e saias logo daqui.

- Meus pais pensam da mesma forma que os teus. Não sei se eles seriam capazes de me entender. Para eles, a opinião dos outros sempre foi mais importante que a minha.

- Olha, mais uma entrou. Se quiseres ir embora, ainda está em tempo. Eu, no entanto, só saio daqui quando tudo estiver resolvido.

- Tens razão. Estou sendo boba. O melhor é resolver esta situação de uma vez. Vou esperar.

- A vida tem umas coisas estranhas. Não nos víamos há tanto tempo e fomos nos reencontrar justamente aqui. E em um momento tão complicado para nós duas.

- Eu também não esperava encontrar ninguém conhecido, menos ainda uma amiga de infância.

- Lembra das nossas brincadeiras no quintal da tua casa? Como éramos inocentes naquela época. Agora, aqui estamos, adultas e prestes a tomar uma das decisões mais difíceis de nossas vidas.

- Olha! A outra já saiu. Desta vez foi rápido.

- Viu? Mais um pouco e tudo estará solucionado. Vamos nos manter calmas.

-É, mas ela parecia abatida. Será que dói muito? Não suporto sentir dor.

- Uma conhecida, que já esteve aqui, me contou que a sensação é a de uma cólica forte. Porém, segundo ela, a recuperação costuma ser rápida e em poucas horas estaremos bem.

- Tomara. Se tiver de ficar de cama muitos dias, não sei que explicações irei dar. As pessoas podem ficar desconfiadas.

- Procura ficar tranquila. Vai dar tudo certo. Agora, é melhor nos despedirmos. Vão me chamar a qualquer momento. Gostei muito de te ver e obrigada pela companhia.

- Imagina! Eu é que te agradeço, afinal tiveste de ouvir minhas lamúrias esse tempo todo.

- Quando tudo isso tiver passado, vamos nos encontrar para pôr a conversa em dia. Temos muita coisa para relembrar.

-Ótima idéia! Eu gostaria muito. Mas... Laura? Antes de nos separarmos, posso te fazer uma última pergunta?

- Claro. O que é?

- Será que Deus vai nos perdoar?

- Não sei. Isso não me preocupa mais. Há algum tempo deixei de acreditar Nele.

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Margarete Hülsendeger
Cronista e contista gaúcha, colabora regularmente com as revistas "Entretextos", "Virtual Partes"; os sites "Argumento. Net", "Portal Literal" e "Tiro de Letra

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