Volta para a capa
História | Objetivo | Definição | Quem somos | Contato | Participe | Mapa do site
<< Voltar | inicial
Conto memória

As mais antigas

Ana Corrêa Pando

       Brincava com meu avô, acho que é a memória mais antiga que eu tenho. Ele sentado numa cadeira de treliça de borracha no alpendre da casa. Fazer isso era muito comum no interior, as pessoas ficavam na frente de suas casa, e viam os vizinhos passarem na rua. Meu avô, nessa época, estava muito doente, ele morreu quando eu tinha uns 4 anos, por aí. Lembro que mexia no pouco cabelo que ele tinha, brincava, penteava, amarrava. Tentava falar com ele, mas ele era muito calado, não me respondeu uma vez, e eu mordi ele. Até hoje sou capaz de morder se não me respondem, sabe quando ficam com um olhar vago, nem que sim nem que não. Mordo!

       Às vezes ele pedia para eu perguntar para minha avó algo. E eu virava um pombo correio, voltava e ia, ia e voltava. O que eu passava de mensagem também não me recordo, mas eu achava essa brincadeira bem divertida.

       Na cozinha ficava minha vó, talvez ela estivesse fazendo o almoço, e ele perguntou se já estava pronto ou o que era que teríamos para o almoço. E bem provável, teríamos bife arroz, feijão, salada, quiabo, estava ótimo. A cozinha parecia uma cozinha de bruxa, mal arquitetada, escura, a janela do banheiro dava para cozinha, tinha até uma vassoura de bruxa. Saindo pela porta da cozinha dos fundos, tinha um corredor haviam dois tanques próprios pra eu brincar dentro. Mais ao fundo uma casinha onde se guardava de tudo, mas não me lembro o que tinha dentro, provavelmente não me deixavam entrar lá dentro.

       O resto era quintal, um quintal meio retangular, que na minha memória infantil parecia enorme. Era tudo terra, e tinha algumas árvores, uma pitangueira, me recordo muito bem de duas grandes mangueiras, pois elas faziam sombra em tudo, e o cheiro dela meio terroso, nunca mais me esqueço, é o cheiro da minha infância. Ficava brincando de baixo dela na terra, fazendo comidinhas, bolo de chocolate.

       As mangueiras tem umas florzinhas com cheiro diferente, e caiam no chão espetava um pouco, mas pé de criança é uma história a parte. Nunca sabia onde estava o meu chinelo. Às vezes alguém aparecia dizendo que tinha uma goiabeira num terreno baldio e todo mundo ia correndo do jeito que tava mesmo, e eu é claro que ia descalça, na volta um espinho entrava no meu pé e de outras três crianças, as minhas primas. Chegávamos chorando, mas depois um adulto teria que tirar o estrepe do pé. Esse era o pior momento.

      Acordar nessa época de manhã era urgência, era uma empolgação, ouvia o galo cantar e já ia acordando aos poucos, ficava ansiosa, queria que meus primos acordassem logo, queria que a Gabi acordasse, tá na hora de brincar!

______________________

Ana Luiza Corrêa Pando

é estudante de Letras na USP e nova colaboradora do Tiro de Letra

- Link1
- Link2
- Link3


© 2007 Tiro de Letra - Mistérios da Criação Literária. Todos os direitos reservados