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Crítica Literária
Alfonso Berardinelli

"Pode parecer um paradoxo, mas me tornei crítico quase sem querer. Nos anos da minha formação a crítica era o caminho mais óbvio para se chegar à literatura. Tanto o romance quanto a poesia refletiam intensamente sobre a própria situação. Desde menino achava que a literatura fosse crítica antes de ser invenção. Li Tolstoi, Camus, Eliot entre os 14 e 18 anos: nos três encontrei um violento mal-estar em relação à vida social. Na universidade, quando comecei a ler ensaios de crítica literária, me atraía muito o estilo dos críticos, além de suas idéias e métodos. Gostava tanto dos críticos escritores como Leo Spitzer, Roland Barthes, Walter Benjamin. Edmund Wilson, quanto da crítica escrita por poetas como Eliot, Montale, Gottfried Benn, Aden, Enzensberg. Para mim a crítica literária estava sempre misturada com a crítica da ideologia, dos mitos contemporâneos, das idéias correntes. Até hoje acredito que a verdadeira crítica (que se distingue do estudo universitário ‘científico’ ou histórico da literatura) seja também crítica da sociedade. Sempre procurei me fazer entender, tentando evitar que os alunos se transformassem em pequenos esnobes. Uma crítica literária chata e obscura é contra-senso, uma verdadeira traição. Nossa tarefa é, antes de mais nada, entender e fazer com que se entenda. É claro que se pode também escrever obras exemplares, de originalidade intelectual, mas isso vem depois... São tempos difíceis para a crítica militante. Um crítico militante é um escritor pleno, um analista da situação humana e social contemporânea a ele. Mas esse tipo de crítica encontra cada vez menos espaço, não só na universidade, mas também nos jornais. A universidade interessa o estudo histórico ou filosófico, uma crítica que cai freqüentemente numa linguagem cifrada. Já no jornalismo prevalecem artigos apressados, muitos deles escritos por gente sem competência literária. Os artigos nos moldes tradicionais estão desaparecendo. Além do que é difícil que esse tipo de crítico fale livremente. A grande maioria diz o que as editoras e os autores querem que se diga. E aí já estamos na publicidade".

Fonte: Folha de São Paulo,25/07/1999 – Mauricio Santana Dias

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