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Dicionário de Mário Ferreira dos Santos

PSICOLOGIA

   a) A palavra psicologia é formada de duas palavras gregas: psykhê, que significa alma, e logos, que significa ciência, tratado. Por isso, etimologicamente, a Psicologia é a ciência da alma, e esta tem sido a definição classicamente aceita. O termo Psychologia foi criado por Melanchton e usado por Glocênio (séculolo XVII).
    A expressão alma refere-se a algo que a experiência exterior não pode alcançar, salvo as suas manifestações, como é considerada pela metafísica clássica, pois os teólogos sempre consideraram a alma um ser espiritual, forma do corpo, e que sobrevive à morte deste. É ela a sede de nossos sentimentos e de nossos pensamentos, permanecendo imutável, apesar de todos os estados transeuntes pelos quais ela passa.
    b) A psicologia, modernamente, não estuda a alma sob esse aspecto, embora não tome uma posição decidida quanto ao problema do espiritual e do material, ou seja, não é nem materialista nem espiritualista. Ela restringe o objeto de suas pesquisas, observações, análises, nos quais procura descobrir a legalidade dos chamados fenômenos psíquicos, regionalmente; isto é, circunscreve-se a um campo restrito, sem maiores preocupações de caráter metafísico. O estudo metafísico da Psicologia pertence à Noologia e à Cosmologia. .
    A Psicologia não pode penetrar no terreno das origens, muito embora no decorrer da sua atividade, tenha ela que tocar em temas que interessam mais diretamente à Filosofia, pois dizem respeito a objetos, que só filosoficamente podem ser tratados.
    Modernamente, a Psicologia tomou um caráter cientifico, afastando-se da teoria clássica. A observação dos fenômenos psíquicos, tais como os da consciência, as sensações, os sentimentos, os raciocínios, os complexos, a memória, os desejos, etc., permitiram fosse ela construída sobre bases cientificas, principalmente depois que lhe foi aplicado o método experimental.
    Desta forma, a Psicologia procura evidenciar, no fenômeno psicológico observável, não mais uma faculdade, mas estabelecer relações de sucessão regular en-tre os fenômenos psicológicos. Na clássica, a alma era considerada como possuidora de determinadas faculdades, tais como a percepção, o raciocínio e a volição. A psicologia moderna não fundamenta mais os fenômenos psíquicos sobre faculdades, e quando emprega este termo o faz como uma expressão cômoda, para compreensão geral.
    Contudo, para os escolásticos, faculdade quer dizer apenas potência e não entidades de per si subsistentes como julgaram muitos ser esse o pensamento escolástico.
    É ela o estudo de certos campos de consciência, que formam o nosso psiquismo, e segundo a tendência mais moderna da Filosofia, estes são irredutíveis, isto é, não se reduzem a outros. Assim, os fenômenos psíquicos não podem ser explicados apenas como fenômenos biológicos, como estes não podem ser explica-dos como meros fenômenos físicos, Há estruturas que formam campos irredutíveis no conhecimento. A Psicologia tem um campo próprio de ação, um objeto próprio, irredutível às outras ciências. A idéia da faculdade era considerada, antigamente, como um poder especial de fazer ou sofrer um certo gênero de ação.
    A teoria das faculdades não admitia uma cisão do psiquismo.
    A alma era considerada como uma unidade indissolúvel, que se manifesta ora como pensamento, ora como atividade (vontade), ora como sentimento. Desta forma, segundo as operações da alma, segundo sua maneira de atuar ou de sentir, é que se manifestavam estas faculdades.
    Psicólogos modernos dispensam as expressões alma e faculdade, em vista das acepções pronunciadamente metafísicas que têm, e transformam-na numa ciência da vida mental e das suas leis, ou seja, numa ciência dos estados do consciência enquanto tais, usando as observações e as experiências como meios para a construção dos seus princípios. Por isso se manifesta, na psicologia moderna, mais um trabalho de investigação dos fatos do que a construção de grandes sinteses ou de sistemas.
    Numerosos são os psicólogos que se preocupam mais com a observação dos fatos isolados ou do seu entrelaçamento, sem se aterem a uma concepção geral, nem tampouco se proporem a construir sistemas, por considerarem que, no ponto em que nos encontramos, muito afastados ainda estamos de podermos realizar esta grande síntese, que caberia aos vindouros.
    Não obstante, são também numerosos aqueles que constroem sistemas cerrados de psicologia, os quais, na maior parte das vezes, não têm podido vencer o tempo e caem espetacularmente, enquanto outros se arrastam dentro de uma existência estéril, prestes a serem abandonados. Absolutamente tais fatos não são um argumento contra a Psicologia, pois considerando o pouco tempo em que se tem realmente empreendido um estudo mais coordenado e científico dos fatos psíquicos, é natural que todos estes acontecimentos se processem, e que conheçamos tantos malogros quantas indecisões.

    DIVISÃO DA PSICOLOGIA

    1) Psicologia racional ( como a chamavam os escolásticos) - a que busca o fundamento metafísico dos fatos psíquicos, que aborda os temas da existência da alma, da sua imortalidade, etc. Está incluída na Metafísica (e será estudada na «Noologia» ) .
    2) Psicologia empírica - a que se cinge em observar os fenômenos psíquicos e a estabelecer e a captar as causas, leis, condições de seu surgimento, cujas afirmações são controláveis pelos fatos. Segue esta os métodos científicos, e está para a psicologia racional assim como estão as ciências naturais para a filosofia natural. Tal não impede haver, entre ambas, pontos de contato, o que á realizado, sobretudo, pela Noologia.
    Podem estabelecer-se outras classificações, mas se considerarmos o estado atual dos estudos filosóficos, a de Wolf permanece viva; pois poderíamos apenas distinguir, na experimental, uma Psicologia Teórica ou Geral, que é uma psicologia de observações, teoricamente estruturada, e uma psicologia de laboratório (frequentemente chamada de experimental), solução que bem corresponde às razões de V. Egger.
    Uma terceira possibilidade de classificação seria a Psicologia prática ou aplicada, de base empírica, mas construída através de buscas metódicas e da contribuição geral de homens experimentados, que, nas mãos de especialistas, transformam-se num conjunto de normas práticas, não só de observação como de aplicação, sem, no entanto, desprezar as contribuições dos outros ramos da Psicologia.
    Também se usa muito a expressão psicologia em profundidade. Distingui-la-íamos como a que orienta as suas observações e buscas no mais íntimo do ser humano, como o procede a psicanálise, em seus diversos setores e tendências, bem como práticas afins. Considerando todos esses aspectos, pode enunciar-se, não propriamente uma definição da psicologia geral, mas em caracterizar-se da mesma, que vale por uma definição:
    A Psicologia é um saber teórico e prático dos fatos psíquicos, que, partindo da observação dos mesmos, busca determinar suas condições, natureza, causas, constantes, leis, bem como aplicar seus conhecimentos em beneficio do homem.
    Nesse enunciado, incluímos já a contribuição da psicologia a outras ciências, como à educação, à sociologia, à moral, etc.
Há um preconceito muito comum entre psicólogos modernos, mais afeitos à psicologia empírica, de que a psicologia clássica era meramente abstrata. Entre os escolásticos foram distinguidas perfeitamente as observações de ordem empírica de as meramente especulativas.
    Que a psicologia, seguindo as normas cientificas, deve ser uma. “psicologia sem alma”, nada se há de alegar, pois não cabe propriamente à ciência, no sentido em que em geral tomamos esse termo, investigar num terreno que é meramente filosófico.

   A alma não é um «tema superado», como ingenuamente o declaram alguns psicólogos modernos. Já há muita coisa “superada” na psicologia moderna, mas o tema da alma impõe-se, hoje, mais exigente do que nunca, e é essa a razão porque o psicólogo, quando se afasta da Filosofia tende a tornar-se um mero empírico, sem alcançar o que há de mais profundo em matéria tão importante. Ninguém pode negar as grandes contribuições da psicologia moderna, mas seria manifestação de palmar ignorância negar as valiosíssimas contribuições da psicologia clássica, sobretudo da racional ou especulativa, sem a qual há privação de bases mais sólidas.

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