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Dicionário de Filosofia de                                Mario Ferreira dos Santos

 

TRABALHO

     a) Na Fisica é a produção de movimento ou de atividade a um corpo que resiste por meio de uma força outra.

     b) Na Fisiologia, é o desgaste de energia na ação muscular ou mental.

     c) Na Psicologia, é a produção de resultados fisiológicos ou psicológicos, por meio da ação muscular ou nervosa, psíquica.

     d) Na Economia, é a atividade produtora de bens. O trabalho é a energia despendida com a intenção de conseguir bens. O homem é compelido, pela sua condição, ao trabalho, por ser o meio de obtenção de bens, ou para a realização de serviços. Os economistas modernos consideram o serviço, embora não tenda à fabricação, à manutenção, nem à distribuição de bens materiais, como o dos médicos, professores e magistrados como trabalho, porque tendem à realização de bens não materiais.

     Discutem os economistas o valor moral do trabalho, considerando uns uma servidão, outros um castigo. A idéia do penoso é associada à idéia de trabalho, o que é natural por influências remotas, porque tendo sido difícil a consecução de bens, esta sempre exigiu esforços.

     Entretanto, na Psicologia, vemos que nem todo esfôrço é penoso e pode até ser agradável. Estudos feitos sobre as condições de trabalho revelam-nos que podemos aumentar ou diminuir o esforço e o desagradável que ao trabalho se associa. Também se verifica que há pessoas que encontram nele verdadeiro prazer, quando este representa ou realiza uma criação, o que o eleva e também os tonifica.

     A educação tem um papel saliente na acentuação ou não do caráter penoso no trabalho. Se os homens são educados, vendo no trabalho algo desagradável, é natural que se predisponham a atualizar o carácter penoso, virtualizando o que possa ser agradável. Ensina-nos a Psicologia que há prazer na atividade, a qual, levada a determinados graus, pode tornar-se desagradável e até dolorosa. A Economia não deve estar adstrita aos interesses criados pelas classes, grupos, etc. Tem ela que, colaborando com a técnica, auxiliar a melhoria das condições de trabalho e a transformação deste de penoso em agradável.

     O TRABALHO NA ECONOMIA - 1) É o trabalho uma atividade consciente e voluntária, que tende para um objeto conscientemente concebido.

    Por isso, o trabalho está incluído também no terreno que cabe à Sociologia, no meio social em que está imerso o agente econômico, em relação, portanto, com a organização jurídica, política, ética, como as condições culturais, e as psicológicas, emocionais, como veremos.

     Todos êsses elementos compõem o fato econômico.

     2) Todo trabalho exige uma soma de esforços, custa; é um ato fisiológica e psicológicamente oneroso

     3) É uma actividade tendente, direta ou indirectamente, à consecução de bens econômicos.

     Uma actividade esportiva ou recreativa, tendente para dar divertimento, não é um trabalho econômico, por lhe faltarem esses caracteres e suas consequências.

     ANÁLISE DO TRABALHO

     Todo acto econômico é, de certo modo, uma troca onerosa. Sua realização custa esforço ou o que o representa. No trabalho, o agente, que o executa, procura obter utilidade. Há, nele, fadiga física ou mental. Ora, o homem é biológicamente hedonista (de hedonê, palavra grega que significa prazer). Procura obter o máximo de utilidade com o mínimo de esfôrço e é essa constante que o orienta na vida. O esfôrço, no início, tem um carácter tônico, hedonista crescente, até atingir um maximun (variável quase sempre), e alcançar aí um patamar (maior ou menor), e conhecer, posteriormente, um decréscimo hedonístico, e uma marcha para o desprazer crescente. Há, assim, variação no prazer.

     PRODUTIVIDADE DO TRABALHO

     A produtividade do trabalho consiste na sua capacidade em tornar os bens aptos ou mais aptos à satisfação das neeessidades; isto é, criar utilidades.

     Seu rendimento fisico ou material consiste na quantidade de bens modificados durante certa unidade de tempo (um sapateiro eonfecciona tantos sapatos em tantas horas de serviço).

    O rendimento utilitário do trahalho consiste na soma de utilidades que produz o trabalho em um determinado produto.

    O rendimento material é técnico, e o de utilidade é econômico.

Vemos, assim, que um rendimento é diferente do outro. Um é quantitativo; o outro, qualitativo.

     Certas obras podem ter um rendimento técnico, sem rendimento econômico. A perfuração de um poço de uma mina sem resultado, em que o minério não foi encontrado, é um exemplo.

     Numa economia monetária e de mercado, há um rendimento em preço do trabalho. Ele consiste na quantidade de bens fisicamente transformada por ele, multiplicada pelo preço unitário do bem, no mercado. Os dois primeiros rendimentos são encontráveis em todos os sistemas econômicos. O último (o de preço) depende do mercado; por conseguinte, do sistema capitalista.

                                               * * *

     É o organismo humano um proporcionador de força motriz. Não tem a relativa continuidade de funcionamento de um motor mecânico.

Interessaram-se os cientistas em estudar o organismo humano em funcionamento no trabalho, e muito ainda se pode esperar desses estudos quanto à melhor utilização do esforço humano sem

desperdícios.     

     Chaveau estabeleceu três leis, completada por uma quarta:

     1) o dispêndio de energia é proporcional à sua duração, ao esforço de contração dos músculos, e ao grau de seu encurtamento.

     2) O dispêndio de energia diminui à medida que a velocidade de contração aumenta.

     3) Existe um esforço e. uma fadiga ótima para realizar o maximum de trabalho com a menor fadiga.

     4) O músculo retorna mais depressa ao seu estado de repouso, quanto mais rápido fôr o seu trabalho.

     O rendimento do trabalho está em estreita relação com a sua duração. Essa proposição, embora nos pareça um lugar comum, foi por muito tempo contestada pelos economistas. No início do capitalismo, na fase paleotécnica, em sua primeira fase, julgou-se que se obteria um aumento do rendimento técnico e em utilidade, desde que se aumentasse a duração do trabalho,

     Hoje, graças aos estudos feitos, compreende-se que o trabalho tem seus graus crescentes e decrescentes, e o seu rendimento médio pode ser estudado e determinado com bastante rigor. O estudo, que se refere ao trabalho sob esses aspectos, pertence mais à Tecnologia.

     É interessante, no entanto, estudarmos os juizos de valor elaborados em relação ao trabalho. Foi sempre, em todas as culturas, e em todas as eras, o trabalho julgado pelos homens, segundo um princípio ético; isto é, quanto à sua dignidade, ao seu valor.

     Esses juízos foram os mais divergentes. As funções, até as necessárias, tiveram julgamentos diversos. Vejamos:

     Na Antiguidade ocidental (greco-romana), o trabalho era exercido por escravos e era a base material da cidade.

     Na Idade Média, o trabalho dos comerciantes e o dos banqueiros, embora julgados úteis, eram subestimados em relação aos trabalhos agrícolas e aos intelectuais. No sistema capitalista, o trabalho manual, embora não o

digam assim os burgueses, é subestimado por estes. E embora o elogiem, tudo fazem para que seus filho não sejam forçados a faze-lo, e tudo fazem para dar aos filhos profissões chamadas liberais; ou seja, que os libertem do do salariado.

     Por sua parte, os proletários e trabalhadores manuais tudo fazem para dignificar e exaltar esse trabalho, elevando-o, dignificando-o, deificando-o até.

     Na Idade Média, com os beneditinos, o trabalho foi deificado. No século XVIII, os fisiocratas elaboraram a tese da produtividade exclusiva do fator terra. Só esta dava um rendimento verdadeiro. Dessa forma a sociedade era dividida, para eles, em duas classes: a classe produtiva, a dos proprietários da terra e os que nela trabalhavam, e as classes estéreis, os industriais e comerciantes.

     O erro dos fisiocratas consiste na confusão entre a criação material de bens (o rendimento físico), e a criação ou aumento da utilidade, a produtividade.

     No século XIX, com os saint-simonianos, são incluidos entre os produtores os grandes empresários, os grandes banqueiros, os artesãos, os produtores agrícolas, os trabalhadores assalariados. São considerados não produtores (classe ociosa) os funcionários públicos e os governantes. Assim a idéia de productividade está ligada a uma transformação da matéria.

     Para os marxistas, a productividade repousa sobre o trabalho, e é sobre ele que repousa o valor. Para eles os productores autênticos são os trabalhadores manuais ou intelectuais.

     Posteriormente, por efeito das conveniências da propaganda, os trabalhadores intelectuais independentes (profisssões liberais) foram postos de lado e subestimados, e considerados como únicos produtores os trabalhadores manuais assalariados e os intelectuais assalariados.

     Devemos considerar primeiramente se um trabalho é produtivo, pouco importando a forma de atividade pela qual é obtida uma utilidade. O trabalho agrícola e o industrial são produtivos. E produtivo é o trabalho comercial. Aqui podem surgir, e têm surgido, contestações.

     Três aspectos podem ser estudados no trabalho do comerciante:

     1) des;locação de bens no espaço; 

     2) conservação dos bens no tempo (estocagem);

     3) aproximação de bens na quantidade e na qualidade desejadas pelo consumidor.

     Essas três funções são essenciais, e se dão em todos os sistemas econômicos. Inclusive numa sociedade coletivista, podem e devem ser transformados os órgãos de distribuição, embora não o sejam as funções própriamente. Essas funções podem ser realizadas por órgãos cooperativos, unindo produtores com consumidores, sem a necessidade dos órgãos capitalistas.

     No capitalismo, os intermediários que realizam tais funções, são:

     a) numerosos;

     b) exigem um ganho como interdiários, excessivo quase sempre.

     Tais intermediários são próprios do regime capitalista. Hoje, como estamos num regime de transição, o intermediário encarecedor pode perfeitamente ser abolido, quando encarecedor, pela aplicação das formas de cooperação.

     Caracteres do trabalho - O trabalho é uma atividade. No regime de escravidão e no de servidão, as forças de trabalho estavam à disposição do senhor ou dono, que determinava seu emprego e duração.

     No capitalismo, o trabalhador passa a ser dono da sua força de trabalho, juridicamente apenas. Ele podia ir ao mercado e vender ou alugar sua força de trabalho, sofrendo naturalmente as contingências variáveis do mercado.

     Com os regimes autoritários, retorna o trabalho à disposição das autoridades, que dele dispõem. Tais factos vemos:

     a) nos países coloniais, com o trabalho forçado das populações indígenas, sob a alegação de interesse público;

     b) nos paises capitalistas, por ex.: nos Estados Unidos, depois da primeira grande guerra, obrigando-se os ex-combatentes ao trabalho para readquirirem a profissão ou se readaptarem às profissões; aproveitamento dos «sem­trabalho» (chômeurs) em 1933 para obras públicas, evitando os males decorrentes de uma «chômage» prolongada, que torna difícil a readaptação.

     Temos ainda outras diversas formas de trabalho forçado para criminosos, delinqüentes primários, etc.

     No sistema capitalista, o trabalho é tratado como uma mercadoria, como um bem, um serviço, dependente da oferta e da procura. Dá-se, então, a despersonalização e desumanização do trabalho, contra a qual são criadas leis protetoras ao trabalhador, através da chamada legislação social.

    Essa legislação não é um acto inerente ao capitalismo, mas um acto de defesa, uma reacção contra ele.

    Não decorre de uma lógica, de um nexo interno do capitalismo, mas de defesa do trabalhador. O capitalista renuncia a certos «direitos» em beneficio do trabalhador, forçadamente, após lutas mais ou menos cruentas e demoradas, e o faz para evitar renúncis maiores. Elas não decorrem, repitamos, da constituição do sistema capitalista.

     Analisemos:

     Na paleotécnica de predominio da máquina a vapor, o trabalho era apenas considerado como um objeto de mercado.

     O ser humano enquanto pessoa não era considerado, como ainda não o é, porque o espirito do capitalismo paleotécnico prossegue dominando as consciências.

     Naquela época, no predominio dessa técnica, o trabalho das mulheres e das crianças era explorado ao extremo.

     Lembremo-nos de Pitt, quando pronunciou tais palavras: «Se os salários são muito elevados, tomai as mulheres e as crianças.»

    Homens, mulheres e crianças eram transformados em escravos da necessidade; piores até, porque pouco importavam as condições de saúde física. Os castigos corporais eram admitidos, e não eram poucos os que tombavam mortos durante o trabalho e durante os castigos.

     As torturas eram empregadas nas oficinas (Suspensão de crianças pelas mãos). O homem não era um homem, mas apenas uma máquina, um motor. A legilação do trabalho foi obtida graças à luta feroz travada por esses super-escravos, e custou muito sangue. Basta a leitura das páginas da história das lutas sociais para aquilatar-se quanto sangue e quanta lágrima foram necessárias para construir as grandes fortunas do mundo. A legislação favorável aos trabalhadores foi conseguida a despeito da resistência dos empresários capitalistas.

     Aliás, a história nos regista. como von Ihering já o afirmava, que toda justiça foi sempre conquistada à força contra os que não queriam admiti-la.

     A remuneração do trabalhador, na paleotécnica, era uma prova dessa desumanização do trabalho. Sem trabalho, o trabalhador torna-se indigente. A assistência social, organizada em seu benefício, procura corrigir, remediar, os males e não resolvê-los.

     O trabalho é pago ao preço mais baixo possivel. Eesse preço mais baixo é o suficiente para manter a vida ou permitir' que ela não se destrua imediatamente. Como não pagar salário não seria possívell, o capitalista da

paleotécnica paga-o na base míniima, na base em que o trabalhador escolhe entre trabalhar para não morrer de fome e morrer de fome ou adiar a morte. :

Esse limite é importante, porque ele revela o sentido do capitalismo paleotécnico, que é uma exploração, uma especulação na baixa.

      Daí a exploração desenfreada das crianças e das mulheres que podiam vender o trabalho a preço mais baixo e, conseqüentemente, a organização técnica despersonalizante do trabalho se desenvolve, porque permite que operários menos competentes possam realizar uma função. A paleotécnica é sempre uma especulação sobre a baixa, inclusive até na qualidade do trabalho.

     Só nessa situação é que pode surgir a idéia do salário mínimo, que é paralela ao predomínio da paleotécnica, mesmo num período neotécnico.

     A maiorr parte do trabalho de execução, no sístema capitalista (operários, empregados, contra­mestres e inclusive diretores e dirigentes)  é dependente.

     É dependente porque:

     a) o agente econômico é ligado ao proprietário e detentor dos meios de produção por convenção jurídica (dependência jurídica);

     b) nüo lhe cabe a escolha nem dos instuumentos, nem do trabalho, nem da matéria prima, nem dos modos de proceder, etc. (dependência técnica);

    c) não responde, quanto ao emprego dos bens produzidos, nem quanto ao ao risco, lucro ou prejuizo verificado ( dependência econômica);

   d) socialmente, sobretudo nos países desenvolvidos da Europa, o trabalhador é dependente socialmente da classe a que pertence, sendo-lhe dificil mudar de profissão, à qual ficam muitas vezes jungidos os filhos (dependência de estamento).

    Esses caracteres de dependência presdipõem, psicologicamente, a classe operária a ter um sentimento de sua exploração e da sua opressão

  No sistema socialista planificado, essa dependência não desaparece. Subsiste a dependência técnica;

   aumenta a dependência juridica, com a criação do Estado como Patrão Único.

    Se a sociedade fór plenamente socialista, sua dependência não será mais contratual, mas estatutária, segundo a comuuidade a que pertença (sociedade anarquista) ;

    a dependência econômica prossegue pelo salário. No caso soviético, há o salariato, única renda do trabalhador.

  O artesão não é dependente nem técnica, nem jurídica, nem econômicamente, salvo por contingência histórica, na sua luta, sobretudo, contra as grandes empresas; não, porém, como decorrência lógica do sistema artesanal.

    COMO RESOLVER ESSA DEPENDÊNCIA? - Dentro do sistema capitalista tal dependência é considerada, pelos socialistas, como insolúvel.

     Temos a solução marxista. Afirmam os marxistas que, com a socialização, podemos transformar radicalmente os caracteres do trabalho, que deixará de ser penoso, substituído por um trabalho «atraente».

    O trabalho é penoso, já vimos. Mas é necessário distinguir o trabalho do artista, do sábio, do estudioso, que é um trabalho penoso, mas agradável.

    Há socialistas que são contrários ao trabalho e consideram-no superável, livrando o homem de seu esforço penoso, permanecen do apenas em sua fase ainda agradável (sindicalistas, etc.). Os anarquistas defendem que o trabalho deve e pode ser sentido como o do artista. Para tal é necessário compreender-se o sentido ético e estético do trabalho, pela inclusão nele da vida, do orgânico.

    Em suma, tais pontos de vista são os que se presumem possíveis na biotécnica.

    O que se pode vcrificar é que a concepção da nacionalização da produção, a transformação do Estado em proprietário dos meios de produção, não resolve o problema de producção, não resolve o problema da dependência, nem o caráter penoso e desagradável do trabalho, mais de ordem psicológica do que fisica, Não é a transformação da propriedade particular em colectiva que resolverá tal problema, como já o salientava Proudhon.

   TÉCN1CA NO TRABALHO ­ Em um sistema econômico, podemos distinguir três coordenadas com suas variações:

     1) a técnica (cujas variações estudamos e aqui analisaremos);

   2) a organização juridico-social (cujas transformações também analisaremos);

    3) o espírito (com seus aspectos variáveis e co-variantes, além do invariante).

     Por si só a técnica não é suficiente para caracterizar um sistema, embora um sistema tenha maior constância dentro de uma técnica. O capitalismo e o colectivismo empregam a mesma técnica, mas as variações são grandes em seus aspectos particulares (eotécnica, paleotécnica, neo­técnica, biotécnica - vi de ) .

    Pode, quanto à Técnica, o capitalismo ser examinado em referência à divisão do trabalho e ao maquinismo.

    Quanto à organização jurídico­social esta nos revela o mais intimo do sistema: os costumes transformados em direitos, que são as aspirações e os interesses criados pelos grupos componentes de uma sociedade.

    Quanto ao espírito, podemos examinar essas aspirações e esses interesses que geram uma verdadeira lógica do sistema, os juízos de valor predominantes, com os quais se procura justificar os atos praticados, as cate-

gorias, os conceitos, e os intuitos.

    A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO - Da organização do trabalho passa-se à racionalização do trabalho.

    Neste caso, as tarefas e operações são sistemàticamente organizadas para obter o máximo de rendimento natural, para alcançar a maior soma de benefícios.

    A racionalização se processa:

    a) Taylorísmo.

   É o Taylorismo um conjunto de métodos e processos de organização científica do trabalho, no interior de uma mesma empresa.

     b) Racionalização propriamente dita.

    Depois da primeira grande guerra, e da crise que a sucedeu, crise da conjuntura, e as transformações sofridas na estrura (movimentos sociais, etc.), processou-se uma racionalização propriamente dita, muito mais ampla que o Taylorismo, concernente ao trabalho num conjunto de empresas.

    c) Humanização do trabalho. Até aqui se cuidou da forma do trabalho, esquecendo-se porém do factor humano, do qual dependia aquele. O homem não é um motor, uma máquina, mas uma pessoa. A Técnica, como a Economia, servem ao homem e não o homem à Economia e à Técnica. Do exame desses três processos surgem vários problemas, que exigem solução.

    E podemos dividi-las assim:

    a) problemas que se colocam quanto às relações entre o homem e os meios materiais de trabalho;

     b) entre o homem e a atividade profissional e as relações entre homem e homem para a execução do trabalho (Hyacinthe Dubruil).

     Examinemos, primeiramente, o Taylorimo

    A sistematização do trabalho já vem de épocas anteriores ao capitalismo industrial.

    Frederic Winslow Taylor (1856-1915) quis pela aplicação à atividade industrial do método científico, obter um. aumento do rendimento material, consequentemente da rentabilidade, com um aumento de ganho em moeda para o empresário, do qual se beneficiaria o trabalhador pelo aumento do salário. Consistia o "sistema Taylor" na aplicação dos conhecimentos científicos à indústria, aumentando a renda e os salários, desfazendo, assim, o antagonismo entre o patronato e o proletariado. Verificou Taylor, como trabalhador, que o trabalho em todas as oficinas, não dava toda renda máxima. A má vontade do trabalhador, o desânimoo, o pouco caso, tudo isso influia para que o trabalhador não tirasse o maior rendimento da sua força de trabalho.

    Juntava a esses factores, a ignorância técnica, a má organização da produção, da ordem de fabricação, cujas interrupções eram contínuas.

    O estudo dos movimentos do trabalhador levou-o a notar movimentos inúteis, mal aproveitados, esforço despendido sem proveito.

    Depois de feito esse estudo, verificou o tempo em que tais momentos se processam, comparando-os entre os diversos trabalhadores, até atingir a uma base segura.

    Completados êsses estudos por outros, foi possível, nos EUA primeiramente, aplicar ao trabalhador as condições das máquinas, o trabalho mecanizou-se totalmente. Verificou ainda Taylor que os salários eram pagos dentro de uma média pouco variável. Era necessário criar o salario diferencial, que permitisse obter do operário o rendimento máximo. Esse suprimento deveria ser de 30% para os trabalhos fáceis e de 60% para os mais dificeis, e que exigissem formação profissional ou vigor físico além do normal. E de 100% para os demasiadamente difíceis, isto é, para os que exigiam além da formação profissional um vigor fisico além do normal.

     Os operários, que produzissem menos que o normal, receberiam menos.

     Desta forma se expulsaria o mau trabalhador.

    Com o sistema Taylor, o operário perde toda iniciativa e passa a ser apenas um mecanismo organizado no conjunto.

    Não é possível dar ao Taylorismo um quadro completo, porque tal matéria pertenceria, por seus aspectos, mais à Tecnologia que propriamente à Economia.

    Por isso os aspectos tecnológicos quanto à organização, divisão das funções dirigentes e controladoras, a ordem de fabricação, a contabilidade, o fichário, instrutores, etc., deixam de ser examinados por ser matéria que ultrapassa os limites deste artigo.

   Mas podemos salientar que teve o Taylorismo uma propagação imensa, primeiro nos Estados Unidos, espalhando-se depois pelo mundo.

   Os trabalhadores resistiram desde logo, nos Estados Unidos, ao taylorismo, obtendo até algumas leis a seu faver, no Parlamento.

  Fundavam-se os operarários em sua luta contra o Taylorismo em constatações de caráter cientifico, o que levou a muitas empresas em não empregá-lo, receosas de represálias dos trabalhadores.

    Hoje mesmo, só parcialmente é aplicado nas grandes empresas,

   Realmente se deve considerar que o Taylorismo havia trazido beneficios quanto ao aspecto quantitativo em geral. Quadruplicara o rendimento de muitas funções. Não é, porém, apenas esse aspecto que se deve considerar. O homem é o mais importante, porque nunca se deve esquecer que a Economia é feita para o homem e não o homem para a Economia. Por outro lado, o taylorismo malogrou em muitas ocasiões e, sobretudo, serviu para esgotar a capacidade criadora do operariado, torná-lo mecânico cada vez mais, tirar-lhe o espírito de iniciativa e de criação. Taylor dizia que um operário em muitas funções, deve «assemelhar-se intelectualmente a um boi» e «trabalhar com os companheiros, ombro a Ombro, ajudados, guiados pelos instrumentos.»

   O Taylorismo trouxe uma superexcitação dos trabalhadores, uma fadiga extrema e o esgotamento. Temos o Taylorismo em sua forma soviética no movimento «stakhanovista», na Rússia, cujos salários são diferenciais, e é também uma superexcitação da capacidade produtiva do trabalhador, levandoo ao esgotamento.

     A RACIONALIZAÇÃO DO TRABALHO

    Com a racionalização, conjugou-se um conjunto de meios de técnica e de medidas apropriadas, a fim de dar o máximo rendimento às emprêsas, quer consideradas isoladamente, quer em grupos.

  Assim a racionalização inclui processos técnicos e processos de organização. Em todas as épocas houve racionalização do trabalho.

    Mas, depois da Primeira Grande Guerra, a necessidade de reorganizar as bases da economia, levou, sobretudo nos Estados Unidos, a procurarem-se meios de racionalização do trabalho, tendentes a estabilizar a conjuntura.

   Na Alemanha, o trabalho industrial, desde seu inicio, foi cientificamente organizado. O homem de ciência colaborou com o industrial.

   Vejamos os elementos da racionalização, já que sua análise caberia a um tratado de Tecnologia. Tende a racionalização para a unificação dos tipos, ou estandardização, que leve a um melhoramento da qualidade com um abaixamento do custo, ao aproveitamento integral das matérias primas, desde a escolha à verificação, à conservação, até à utilização dos residuos e dos sub­productos; à adaptação de condições e meios de trabalho do agente, por dois aspectos: a psicotécnica objetiva, que é a adaptação dos meios ao agente, e a psicotécnica subjetiva, que é a adaptação do agente humano às condições e aos meios de trabalho; concentração das empresas e a criação de laços entre elas, sobretudo com as que anteriormente eram concorrentes, e que se tornam, depois, cooperantes.

    A racionalização do trabalho não encontrou resistências sérias da parte do trabalhador, que nela colaborou até, por encontrar muitas soluções que lhe eram benéficas.

   A HUMANIZAÇÁO DO TRABALHO - O movimento de humanização do trabalho é também complexo, variado e cheio de fórmulas e processos múltiplos múltiplos. Como também cabe à Tecnologia,  analizaremos apenas os aspectos que possam interessar ao estudo econômico.

   Um dos grandes problemas sempre foi o da escolha da profissão e sobretudo da aptidão unida à profissão. A seleção profissional, ao lado de uma orientação profissional, foi um dos aspectos que mais interessaram depois da 1ª Grande Guerra, para a eriação de um operariado capaz de dar o maior rendimento.

    A orientação profissional se processa em geral por uma pre­orientação, que é uma uma educação às crianças durante a escolaridade, já preparando-as para o futuro profissional, daí para um exame de aptidões, que leve a conhecer melhor profissão para o jovem..

    O que se pode chamar de humanizazação do trabalho é uma longa e ainda não acabada obra em benfício do homem, não mais utilizável como um instrumento, mas capaz de realizar-se plenamente através do trabalho. Um dos maiores estudiosos deste tema é Hyacinthe Dubreuil, que tem' estudado a organização na oficina capitalista. 

    Saus pesquisas levaram a várias criticas interessantes, que podemos sintetizar: as relações entre o homem e a coisa, as relações entre pessoas, a intervenção do Estado através da legislação protetora do trabalho, que tem efeitos muito limitados (ela elimina abusos gritantes, mas deixa subsisitir dependência econômica e juridica do trabalhador e aumenta a que o liga ao Estado: Em suma, ele sai de um paternalismo para outro maior).   

    As observações de Dubreuil, como de muitos outros, vieram comprovar as teses já expostas por Kropotkin. O trabalho de maior rendimento é o trabalho mais livre. O trabalho servil foi sempre pouco fecundo, como o é o trabalho salariado. Os que, em nossas sociedades, «fazem o máximo de sua actividade, dão o seu máximo, são os que trabalham sem o peso de qualquer constrangimento: o camponês no campo, o sábio ou o artista em seu laboratório ou oficina.»

   As observações feitas até entre nós revelaram a capacidade criadora dos nossos trabalhadores quando livres, mas quando têm uma consciência ética dessa liberdade.

    Tais opiniões encontram bases psicológicas para justificá-lIas,

    Resumamo-Ias:

   1) O trabalhador não assalariado, mas organizado sob a forma de cooperação, é um produtor cuja remuneração não é exclusivamente fixa. Pesa sôbre ela um «risco», mas tem uma «margem de esperança».

    Pode o trabalhador melhorá-la, aumentá-la. Ela é um prolongamento da sua personalidade.

    2) O trabalho é uma atualização do homem quando ele é livre, porque este se afirma. Não é um instrumento de ganho apenas, mas uma realização da personalidade. Dubreuil não foi um homem de gabinete, mas um operário que viveu entre operários e estudou sua capacidade, seus anseios, sua psicologia e as conclusões que tirou são comprovadas por outros estudiosos, que não esquecem nunca que a Economia foi feita para o homem e não o homem para a Economia.

   Julgam muitos que a libertação do operário do salário, isto é, do comprador do seu trabalho, só será obtida, pelo artesanato. Tal não se poderia dar, pois o artesão, no mercado de trabalho, não poderia competir com as grandes empresas e suas unidades.

   Pensa Dubreuil que é possível organizar uma autonomia técnica e contábil das oficinas, como já se fez na Creusot, em França.

   Cada serviço compra dos outros as matérías e máquinas de que necessita, e vende os produtos que fabrica. Pensa Dubreuil, assim, eliminar o salárío. Grupos de trabalhadores livres contratam sua produção com a direção, permanecendo senhores da nomeação de seus chefes se necessárío, e da repartição do producto total obtido. Dubreuil cita várias experiêcias já efetuadas, como contratos de comandita para a composição em tipografias, contratos entre empregados e empregadores, etc. Desta forma, prevê a libertação de três dependências do trabalho no capitalismo: a dependência técnica, a dependência jurídica e a dependência econômica. A primeíra se dá pelos contratos, a segunda é substituída por uma relação comercial entre o proprietário dos meios de produção e dos grupos de operários livres; a terceira, singularmente reduzida, porque se dá, em vez de um salário miserável, uma repartição livre. Dessa forma, seria transformada a usina industrial capitalista num centro de colaboração.

    Que resultaria dai? O fator humano sería utilizado para sua plena inicíativa, sob sua inteira responsabilidade e liberdade, animando a vida autônoma dos trabalhadores, os quais ficariam associados às transformações da técnica e do maquinismo, sem a necessidade de ressentimentos nem, de resistências.

    A disciplina seria aceita, porque lhes seria útil, além de poderem por si mesmos escolherem os melhores para guiá-los.

     Desta forma, a oficina seria uma escola para a vida social, uma atividade plenamente humana, sob a base da responsabilidade e da solidariedade. Esse plano de humanização do trabalho, libertariamente organizado, poderia ser aplicado em qualquer sistema econômico, salvo ao que desejasse fundar-se sobre um autoritarismo absoluto, como é o caso do socialismo autoritário (marxista, hitlerista, etc.).

    Mas, mesmo numa organização de Estado socialista planificado, em que se respeitasse o trabalhador, a disciplina seria voluntàriamente aceita pelos grupos livres. Ele oferece, pelo menos, a possibilidade de resolverem-se os problemas das dependências do trabalho.

    Contudo, é preciso considerar o ato humano e os seus elementos, pois o vício que possa sofrer, influi de tal modo que pertuba os aspectos positivos que essa solução oferece.

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