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Política
Alberto Moravia

“Essa questão do engajamento é um tanto complicada: tentemos examiná-la nas raízas. Nasci na burguesia romana e tinha quinze anos quando o fascismo chegou ao poder. Por muito tempo não fui nada `engajado`. Não era capaz de enxergar a política além dos limites da classe em que me coube crescer e viver. Eu era um jovem burguês de um país onde inexistia vida política. Acresce que a literatura me absorvia por inteiro, até mesmo a nível de fatos do dia-a-dia. Em minha adolescência os grandes acontecimentos foram a descoberta de Rimbaud e Dostoievski. Para mim, a literatura possuía prestígio supremo. Existia, porém, dentro de mim mesmo um elemento que inconscientemente se ia transformando em política: era meu moralismo, algo que se desenvolvia com prepotência e instinto de  necessidade física. Foi sobre esse fundamento moral, e não sobre um fundamento – como dizer? - `técnico`, que vi nascer meu interesse político. Eu nada sabia do lado `técnico` da política; não sabia falar em público, nem tinha noção do que fossem assembléias, moção, ordem do dia, Enfim, eu nada tinha dos jovens de hoje que já aos treze anos se acostumam a agir como parlamentares Eu sempre estava só. Minha revolta era individual, solitária e talvez por isso mais violenta... ? Respeito Sartre também por ter sido o defensor dessa fórmula. Suas intenções são nobres, suas justificativs convincentes. Apesar disso, não gosto do engajamento na literatura. Desde o início recusei, sempre o considerei um falso problema, ou melhor, um perigo. A literatura não é de tal maneira que exclui o engajamento. O intelectual que pretenda sentir-se engajado dispõe de outros modos para manifestar essa vocação: o artigo de jornal, o panfleto, o discurso em praça pública. Por que perturbar o romance ou a poesia? Um romance 'engajado' é para mim, mau romance como obra de arte e má propaganda como obra política. Além disso, a mera palavra 'engajamento' me provoca um ímpeto de desconfiança; o fascismo não parava de pedir engajamento a seu favor e mais ou menos pelas mesmas razões adotadas mais tarde pela esquerda".

Fonte: MORAVIA, Alberto. Entrevista sobre o escritor incômodo (realizada por  Nello Ajello). São Paulo: Civilização Brasileira, 1986.

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